As comunicações ópticas
Um projeto estratégico
Os maiores frutos das pesquisas com laser, porém, aconteceram na área das comunicações ópticas. Já vimos acima que o governo tinha interesses estratégicos em melhorar a eficiência, centralizar e estender por longas distâncias os sistemas de comunicação nacionais. Para alcançar esse objetivo, em 1965 foi criada a Embratel e, em 1972, a Telebrás - que passou então a controlar a própria Embratel e as operadoras estaduais.
José Ripper Filho, fundador do primeiro Departamento de Física Aplicada do Brasil, no IFGW.
Fonte: foto de Neldo Cantanti
A Telebrás planejava também investir no desenvolvimento de pesquisas para a formação de um parque industrial brasileiro nessa área. Quando souberam dessa intenção, pesquisadores do IFGW, já em 1972, entraram em contato com o presidente da empresa. A partir daí, começaram diversos convênios da mesma com a Unicamp e outras universidades nacionais. Um deles foi o Projeto Sistema de Comunicação por Laser, com a Unicamp, coordenado por José Ellis Ripper Filho. Os lasers seriam desenvolvidos pelo Laboratório de Pesquisas em Dispositivos (LPD), liderado por ele e pelo indiano Navin Patel. Esse laboratório passou a constituir o início do Departamento de Física Aplicada, o primeiro desse tipo no Brasil, fundado por Ripper.
Na mesma época, Sérgio Porto sugeriu ao governo pesquisar fibras ópticas. Era uma idéia de ponta: apenas dois anos antes, em 1970, cientistas nos EUA haviam conseguido alcançar o grau necessário de aperfeiçoamento das fibras para viabilizar a construção de sistemas de comunicações ópticas. O primeiro sistema desse tipo começaria a ser instalado naquele país em 1978. O Brasil, portanto, começou a investir em fibras ópticas no momento do seu nascimento.
A Telebrás aceitou financiar o projeto das fibras e, em janeiro de 1974, foi firmado um novo contrato entre a empresa e a Unicamp, que incluiu, no Projeto Sistema de Comunicação por Laser, um Sub-Projeto Fibras Ópticas. A ideia era que as fibras fossem produzidas no IFGW e os lasers pelo LPD. Estes - o laser e as fibras - são os dois elementos fundamentais para as comunicações ópticas (no laser se codifica a informação; a fibra transmite laser - e a informação - para os destinos). Além disso, foram envolvidos também grupos da Faculdade de Engenharia Elétrica da Unicamp. O grupo de fibras ópticas no IFGW originou o atual Grupo de Fenômenos Ultrarrápidos e Comunicações Ópticas (GFURCO).
O objetivo do projeto era desenvolver a tecnologia de fabricação de fibras ópticas e em seguida transferi-la à indústria nacional. Para isso, a Telebrás fundou um núcleo de pesquisa seu, o Centro de Pesquisas em Desenvolvimento e Telecomunicações (CPqD), instalado em Campinas em 1976.
A fibra nacional
A primeira fibra ficou pronta em abril do mesmo ano. O próximo passo foi a assinatura de um novo contrato entre a Telebrás e a Unicamp, o Projeto Sistemas de Comunicações Ópticas, coordenado por José Mauro Leal Costa. A ideia era que os estudos acadêmicos ocorressem na universidade e os projetos de interesse aplicado fossem feitos no CPqD. Este, por sua vez, transferiria esse conhecimento aplicado para as indústrias. O grupo de fibras ópticas foi dividido e parte dos pesquisadores foi para o centro da Telebrás.
Chegada dos primeiros equipamentos de fibra óptica no Departamento de
Eletrônica Quântica, em 1976
O primeiro teste prático de uma fibra óptica feita no Brasil aconteceu em 1981, nas instalações elétricas da Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL) em Americana e São José do Rio Preto, para monitoramento de disjuntores. Em 1982, foi testado o primeiro trecho longo de comunicação por fibras ópticas (o primeiro "enlace"), chamado ECO-1, com 4 quilômetros de comprimento, em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro.
Fibra óptica fabricada no IFGW em 1978.
Transferência de tecnologia
O CPqD, então, começou a fase de transferência para as indústrias do conhecimento tecnológico que adquiriu - no caso, para a ABC-Xtal, em 1983. Essa empresa também se estabeleceu em Campinas e vários pesquisadores do Grupo de Fibras Ópticas da Unicamp (e do CPqD) foram trabalhar lá. O primeiro acordo entre a Telebrás e a ABC-Xtal previa a produção de 2 mil quilômetros de fibra óptica em 12 meses. Em agosto de 1984, foi entregue o primeiro lote, que somava 500 km.
Finalmente, no mesmo ano, começou a funcionar o primeiro sistema de comunicações ópticas não-experimental totalmente desenvolvido e produzido no Brasil, entre duas estações telefônicas de Uberlândia, MG. A partir de então, outras empresas juntaram-se à ABC-Xtal para fabricar as fibras no Brasil.
Na Unicamp, então, os pesquisadores envolvidos com as fibras passaram a fazer pesquisa de perfil mais acadêmico para as novas tecnologias nas comunicações ópticas que então despontavam, incluindo estudos sobre fenômenos ultrarrápidos e pontos quânticos. Os envolvidos com o laser diversificaram suas pesquisas com investigações sobre novos materiais (produção, caracterização e processamento), incluindo nanoestruturas semicondutoras, e a fabricação de dispositivos microeletrônicos e optoeletrônicos feitos com semicondutores. Nos anos 1980, começaram pesquisas teóricas com óptica quântica, incluindo comunicações quânticas e computadores quânticos.
A partir dos anos 1990, vários desses pesquisadores envolveram-se intensamente com projetos grandes como o Centro de Pesquisas em Óptica e Fotônica (CePOF), o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Fotônica e Comunicações Ópticas (Fotonicom) e a Kyatera (uma internet avançada para pesquisas acadêmicas que engloba vários institutos de pesquisa do Estado de São Paulo). Ripper, por sua vez, fundou uma empresa dedicada a tecnologias de comunicação, a AsGa.
A vinda do CPqD e da ABC-Xtal a Campinas iniciou um processo que fez de Campinas um pólo de tecnologia avançada no país. Dezenas de empresas instalaram-se nas proximidades da cidade, entre as quais - vinculadas com o projeto de comunicações ópticas – a Padtec, a Fotônica, a AsGa, a Optolink, a Fiberwork e a KomLux.