Grupo de Física de Plasmas e Fusão Termonuclear Controlada (GFPFTC)
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Prof. Dr. Munemasa Machida (Responsável)
Prof. Dr. Paulo Hiroshi Sakanaka
Plasma é um quarto estado da matéria, além dos conhecidos sólido, líquido e gasoso. À medida que esquentamos uma substância, suas partículas (átomos ou moléculas) se agitam cada vez mais freneticamente e as ligações entre elas vão enfraquecendo ou se quebrando. Assim, no líquido as partículas estão ligadas entre si mais fracamente que nos sólidos (por isso têm a forma instável); nos gases, essa ligação praticamente desaparece.
Agora, se esquentarmos um gás a vários milhares de graus, são as próprias partículas que se separam em partes (moléculas dividindo-se ou átomos perdendo elétrons, isto é, ficando ionizados), dando origem a um novo estado da matéria chamado plasma. Isso pode ser conseguido também se passando eletricidade no gás - exemplos disso são os "plasmas frios" no interior de lâmpadas fluorescentes e das telas de TVs a plasma.
Os plasmas são de interesse em astrofísica - aparecem no interior do Sol e das estrelas - e no processamento de materiais - por exemplo, na fabricação de películas muito finas com até poucos átomos de espessura. Porém, são mais conhecidos por oferecerem a possibilidade de se obter a fusão termonuclear controlada (a partir de plasmas quentes). Tratar-se-ia de uma fonte de energia muito abundante e muito mais limpa que a da fissão nuclear, usada nas usinas nucleares comuns (vide box abaixo). Diz-se “controlada” em contraposição à energia gerada nas explosões de bombas de hidrogênio (bombas H).
Fonte das figuras: Wikipedia
A fissão nuclear acontece quando um átomo se divide em dois ou mais e libera energia. Na figura ao lado, um núcleo de um átomo de urânio é atingido por um nêutron, fica instável e dividem-se em um núcleo de bário (Ba) e um de criptônio (Kr), mais três nêutrons e energia. Ocorre, por exemplo, nos reatores das usinas nucleares comuns, onde normalmente o urânio é usado como combustível. A energia liberada é usada para aquecer vapor de água que, por sua vez, por meio de uma turbina, movimenta um gerador que produz a eletricidade.
Na fusão nuclear, dois núcleos atômicos se fundem, formando um só e também liberando energia. Acontece no interior do Sol (essa é a fonte de energia solar) e, em pequena escala, também no interior dos aparelhos para se estudar fusão nuclear controlada. Na fusão, o combustível mais usado consistiria em isótopos de hidrogênio (certos "tipos" mais pesados de hidrogênio, como o deutério e o trítio). Na figura abaixo, um átomo de deutério e um de trítio (dois tipos diferentes de hidrogênio) se fundem formando um de hélio e liberando uma energia de 3,5 MeV (megaelétron-volt, unidade apropriada para física nuclear), sobrando ainda um nêutron, que carrega mais 14,1 MeV.
As principais diferenças práticas entre os dois processos é que a energia liberada pela fusão é maior (proporcionalmente à quantidade de combustível queimado) e ela é muito mais limpa que a fissão. A fissão produz rejeitos radioativos de longuíssima duração, como o plutônio e artefatos contaminados; já a fusão ativaria (produziria radioatividade) somente nas paredes do eventual reator, sendo que o trítio, que seria usado como combustível, tem vida média de apenas 12 anos.
Acontece que os problemas técnicos e teóricos envolvidos são imensos. A pesquisa sobre o assunto já tem 60 anos e talvez sejam necessários mais 60 até que a primeira usina a fusão controlada comece a produzir eletricidade comercialmente. Grandes experimentos de fusão, baseados em máquinas chamadas tokamaks, estão sendo construídos, sendo o mais promissor o do ITER, no sul da França, que envolve a colaboração de vários países (União Européia, Japão, EUA, Rússia, China, Índia e Coréia do Sul).
O Grupo de Física de Plasmas e Fusão Termonuclear Controlada estuda plasmas (quentes) com o objetivo de contribuir para a solução desses problemas.
Como um plasma apropriado para a fusão seria muito quente – dezenas de milhões de graus Celsius –, não pode ser contido normalmente: há que se evitar o contato com as paredes materiais (isso, além de danificá-las, também esfriaria o plasma). Para isso, pode-se aproveitar o fato de que ele é constituído basicamente de partículas carregadas eletricamente (pois, por causa da alta temperatura, os átomos perderiam seus elétrons, ficando eletricamente positivos) - apesar de, como um todo, ele permanecer neutro (as cargas positivas e negativas se compensariam). A idéia é usar campos magnéticos e correntes elétricas induzidas no plasma de maneira a desviar convenientemente as trajetórias das partículas (que normalmente caminham veloz e aleatoriamente para lá e para cá), de modo a mantê-las sempre dentro de uma região do espaço. A isso se chama “confinamento magnético”.
Esse campo magnético é gerado por correntes elétricas (analogamente a um eletroímã). A estrutura mais própria para isso tem a forma de uma câmara de ar ou de uma rosquinha, como na figura ao lado – chamada toro ou toroide pelos físicos e matemáticos.
Mas nada na fusão controlada é simples. As partículas tendem a se mover para fora do toro e, quando elas atingem as paredes do aparelho, o plasma esfria e o sistema pára de funcionar. Para resolver isso, deve-se estudar o plasma para determinar modos de evitar tal movimento, chamado de deriva.
Se o plasma conseguir sobreviver suficientemente quente por cerca de 10 segundos com densidade suficiente (da ordem de um milionésimo da densidade do ar na pressão atmosférica), o aparelho poderia produzir mais energia do que gastaria – condição sine qua non, conhecida como critério de Lawson, para que se possa construir uma usina que gere energia (e não que consuma).
Estando o plasma no interior do tokamak a uma temperatura de milhões de graus, é de se imaginar o que acontece se esse plasma encostar nas paredes do aparelho ou escapar para o ambiente externo. Na verdade, nada de mais. A razão é que a densidade do plasma é muito baixa (o do NOVA-Unicamp é um milhão de vezes menos denso que o ar). Portanto, há muito pouco material quente dentro do tokamak. Se ele encostar nas suas paredes, não acontece quase nada com as mesmas: simplesmente o plasma esfria na hora e volta a ser gás. Desta forma, um eventual acidente com a câmara de um tokamak não implicaria em vazamentos radioativos perigosos.
Até agora, só o tokamak JET (Joint European Torus), no Reino Unido, conseguiu manter o plasma confinado durante alguns segundos, mas a uma temperatura abaixo da necessária, de algumas dezenas de milhões de graus. Espera-se que o ITER consiga tais marcas e torne-se o primeiro reator a produzir mais energia que gasta. Prevê-se a formação do primeiro plasma (a 150 milhões de graus) no ITER em 2018 e o início do funcionamento de uma usina de energia com base no aparelho na década de 2030.
O Grupo realiza pesquisas teóricas e experimentais sobre o problema da fusão termonuclear controlada em plasmas confinados magneticamente. Na parte teórica, investiga-se, por exemplo, modelos físicos (teorias) que descrevem o plasma para se descobrir como melhorar o confinamento e como diminuir ao mínimo possível a deriva das partículas; e, também, como produzir uma corrente elétrica no plasma utilizando os chamados métodos não-indutivos, em alternativa ao método mais comum de obtê-la por meio de uma aparelhagem semelhante a um transformador (ou seja, por indução eletromagnética).
A parte experimental também aborda esses mesmos problemas, em articulação com a teórica. Para isso, o laboratório no IFGW possui um tokamak chamado NOVA-Unicamp, recebido como doação do Japão em 1996. É um aparelho pequeno em comparação com os gigantes pelo mundo afora, mas o tamanho dá vantagens: é muito mais barato fazê-lo funcionar e, assim, pode-se repetir um experimento quantas vezes se quiserem até se conseguir chegar a uma conclusão sobre uma teoria ou um teste.
O NOVA-Unicamp realiza experimentos com plasmas de hidrogênio. O gás no seu interior é um milhão de vezes menos denso que o ar. (1013 partículas por centímetro cúbico). Para produzir o plasma, o aparelho eleva a temperatura desse gás até cerca de 1,5 milhão de graus Celsius (essa é a temperatura dos íons; a dos elétrons é mais alta). O plasma sobrevive por 15 milissegundos, tempo suficiente para se realizar as investigações do grupo. Apesar da baixa densidade, um campo magnético de 1 tesla mantém o plasma a uma pressão 20 vezes maior que a pressão atmosférica.
o tokamak NOVA-Unicamp pode ser visto em azul as bobinas condutoras dentro da estrutura em vermelho
O tubo de metal na frente do tokamak. Através dele, é possível ver a luminosidade do plasma dentro do aparelho
O que se faz nesses estudos experimentais é medir parâmetros básicos do plasma, como temperatura, densidade e tipos de impurezas que o contaminam, para que se possa fazer um diagnóstico do mesmo e, assim, poder testar algumas técnicas e analisar seus resultados - que podem, então, ser comparados com medidas obtidas em outros tokamaks ou com resultados teóricos.
O estudo das partículas que constituem o plasma é importante porque as impurezas que sempre existem prejudicam o fornecimento de energia: se houver partículas muito pesadas em demasia, elas absorvem a energia que deveria ir para as leves, que são as que interessam. Porém, as impurezas também fornecem informações sobre o plasma, pois o hidrogênio ionizado (sem um elétron), principal constituinte do plasma, é uma fonte muito pobre de informações. A razão é que essas informações vêm da luz emitida pelos elétrons dos átomos quando eles mudam de energia – mas o hidrogênio tem um só elétron, de modo que sua versão ionizada não tem elétron algum para emitir essa luz.
O grupo começou com a chegada de Prof. Paulo Sakanaka, em 1974, vindo do Courant Institute of Mathematics, na New York University, nos EUA. Prof. Sakanaka foi um dos físicos brasileiros no exterior que Prof. Sérgio Porto convidou para formarem o Departamento de Eletrônica Quântica (DEQ) do IFGW. Com ele, vieram vários outros, como Prof. José Busnardo Neto, Ricardo Galvão, Shuko Aihara, Massanobu Niimura, Helmut K. Bockelmann e Aruy Marotta.
Prof. Sakanaka queria trabalhar com plasmas e, assim, fundou o primeiro grupo teórico-experimental no Brasil cujo objetivo principal era estudar esse assunto. Inicialmente no DEQ, o laboratório foi transferido para um prédio novo em 1980 (o Laboratório de Plasma).
Também nesse período inicial, em experimentos liderados por Prof. Shuko Aihara e, posteriormente, pelos professores José Busnardo Neto e Aruy Marotta, o grupo produziu a primeira tocha de plasma do Brasil, instrumento que tem vários usos industriais. Marotta, em 1987, fundou o Grupo de Física e Tecnologia de Plasmas, dedicado principalmente a essas tochas.
Em 1990, houve um golpe nos estudos sobre fusão nuclear controlada no mundo inteiro: vários cientistas dos Estados Unidos concluíram que a estratégia para se obtê-la, com base em tokamaks, não era a mais razoável e praticamente todo o programa do país sobre esse assunto foi suspenso. Alguns laboratórios estadunidenses fecharam – até então, os maiores tokamaks do mundo estavam lá – e vários países cujas pesquisas dependiam de colaboração com os EUA, como a Austrália, seguiram o mesmo caminho. Mas o resto do mundo – principalmente europeu e japonês – continuou acreditando nos tokamaks.
O Brasil insistiu nessa linha e agora é o único país do Hemisfério Sul que investe na construção e manutenção de tokamaks (há outros que pesquisam plasma, mas não possuem essas máquinas, como a Argentina).
Hoje, os Estados Unidos, além de participar do projeto ITER, tentam também conseguir a fusão controlada com a chamada “fusão inercial”, baseada em grande número de micro explosões nucleares produzidas com auxílio de raios laser. Um dos principais experimentos nessa linha é o National Ignition Fusion Experiment (NIFE).
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