Grupo de Estudo de Física e Astrofísica de Neutrinos (GEFAN)
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Prof. Dr. Orlando Luis Goulart Peres (Responsável)
Prof. Dr. Pedro Cunha de Holanda
Prof. Dr. Marcelo Moraes Guzzo
O Grupo de Estudo de Física e Astrofísica de Neutrinos estuda a física das partículas subatômicas do ponto de vista teórico. Porém, o foco é em uma certa partícula específica, o neutrino . Nos últimos anos, ele tem se revelado uma chave importante para diversos mistérios não só da física subatômica, mas também da astrofísica.
O que é, afinal, um neutrino? É uma das dezenas de partículas elementares conhecidas (veja o box no fim deste texto). Porém, diferentemente dos familiares próton, elétron e nêutron, ele não se associa a outras partículas para formar átomos, moléculas etc.: ele simplesmente existe a sós pelo espaço, vagando praticamente à velocidade da luz.
Toda partícula é única, mas às vezes o neutrino parece mais único que as outras:
Extremamente pequeno: É a mais leve depois do fóton (o fóton não tem massa, possui apenas energia). Sua massa é desconhecida, mas os dados indicam que deve ser cerca de 250 mil vezes mais leve que o “terceiro colocado”, o elétron, ou ainda menor.
Extremamente intangível: 99,999% dos neutrinos vindos do espaço que atingem a Terra atravessam-na como se ela fosse transparente e saem pelo outro lado. Assim, os neutrinos que se consegue detectar são extremamente raros – o laboratório do grupo Minos, no Fermilab, nos EUA, que produz neutrinos em grande quantidade para estudá-los, só consegue detectar quatro por dia.
Um dos detectores de neutrinos do experimento Minos, nos EUA. Repare o tamanho das escadas à direita.Os neutrinos são extremos também pelo tamanho dos equipamentos necessários.
Extremamente numeroso: A cada segundo, 65 bilhões deles atingem cada centímetro quadrado da Terra.
Pode determinar os destinos do extremamente grande: Os cientistas usam neutrinos para estudarem estrelas, galáxias, aglomerados de galáxias e as raras explosões de raios gama, os eventos mais energéticos já vistos no Universo, de origem desconhecida. Além disso, como são tão numerosos, se tiverem massa suficiente, mesmo que minúscula, o campo gravitacional do conjunto dos neutrinos existentes por todo o espaço pode influenciar o modo como o Universo como um todo evoluiu - sua expansão, a formação das galáxias. Definitivamente, tamanho não é documento.
E o que os teóricos do grupo fazem com esses neutrinos? Bem, o nome do grupo contém essas duas palavras: “física” e “astrofísica”. Vejamos a que cada uma se refere.
1. Com relação à física dos neutrinos, eles os usam como instrumento para testar novas teorias sobre as partículas elementares. E por que testar nova teorias? A atual não é boa? Não o suficiente. É verdade que teoria moderna, chamada Modelo Padrão, formulada nos anos 1970 e baseada na teoria da relatividade especial e na mecânica quântica, é a teoria que exibe a maior concordância com as observações, dentre as construídas até hoje pelo ser humano. Mas a concordância não é total. Portanto, é preciso melhorá-la.
Diante disso, como melhorar a teoria? Uma maneira é construir movos modelos teóricos, baseados em hipóteses plausíveis, e testá-los. E o melhor modo de se testá-los é comparar suas previsões teóricas com as observações. Os resultados teóricos, para serem comparados com os de experimentos, são calculados por simulações em computador (por meio de softwares adaptados pelos membros do grupo).
Os neutrinos são particularmente prolíficos para esses testes. Eles se conectam com boa parte dos problemas teóricos principais do momento, na área da física das partículas. O que o GEFAN faz, então, é testar novas teorias construídas pelos seus membros, comparando suas previsões com os resultados experimentais de laboratórios e observatórios de neutrinos espalhados ao redor do mundo, parte delas analisadas por outros grupos experimentais do próprio IFGW.
O Modelo Padrão (a teoria atual da física das partículas) funciona espetacularmente bem, a ponto de conseguir prever corretamente uma quantidade física até a décima casa decimal: é o chamado “fator-g” do múon, um número que entra nas equações físicas e que se relaciona com o magnetismo intrínseco dessa partícula, o múon. É a primeira vez que uma teoria física consegue coincidir com os experimentos de forma tão precisa. No entanto, os cientistas acham que essa teoria precisa ser substituída. Por quê?
Há três tipos de motivos.
1. Motivos filosóficos: As teorias físicas são apenas aproximações da realidade. É sempre uma questão de tempo até seus limites serem alcançados. Esse momento, quando chega, é excitante, porque é quando as pessoas começam a ter “dicas” sobre novas físicas e as surpresas que elas podem nos reservar.
Às vezes uma teoria sobrevive por séculos antes de ser substituída. A mecânica de Newton durou cerca de 300 anos. Porém, mesmo na época em que o Modelo Padrão foi feito, em 1974, já havia razões mais concretas para se saber que seria logo substituído por outra teoria - descritas no próximo item:
2. As lacunas: O Modelo Padrão descreve três das quatro forças fundamentais da Natureza – a eletromagnética, a forte e a fraca – e deixa de fora a gravitacional. Esta última não tem ainda uma teoria adequada para o micromundo.
Mas há lacunas mais graves: o Modelo Padrão simplesmente não dá instrumentos para calcular várias coisas que estão dentro do seu escopo. Por exemplo, enquanto ele fornece fórmulas muito precisas para calcular as probabilidades de as partículas transformarem-se umas nas outras, não dá instrumentos para calculá-las no caso de transformações entre quarks – apesar de essas transformações não serem proibidas (e acontecerem na prática). Há diversas lacunas desse tipo no Modelo Padrão.
Diagrama mostrando as transformações possíveis entre os seis quarks u, d, c, s, t e b. O Modelo Padrão, apesar de não proibir essas transformações (e até especificar certas relações entre elas), não dá instrumentos suficientes para quantificar sua ocorrência.
3. Discrepâncias com experimentos:Essas, são, evidentemente, as mais graves. Ironicamente, uma das discrepâncias está justamente naquele cálculo que era o mais citado como o maior sucesso da empreitada teórica humana para compreender a natureza: a concordância de dez casas depois da vírgula para o fator-g do múon, citada no início deste box.
Pois eis que, em 2006, no laboratório de Brookhaven, nos Estados Unidos, medidas precisas mostraram discrepâncias com a previsão teórica para o fator-g do múon... na décima-primeira casa decimal! É pouco, mas o desvio é substancial o suficiente para indicar que os limites do Modelo Padrão já começaram a ser ultrapassados na prática.
Os números mais recentes para o valor do fator-g do múon. A discrepância entre teoria e observação (em vermelho) alcança a antepenúltima casa decimal e é maior que a imprecisão de ambas, que só alcança a penúltima.
Isso pode parecer muito pequeno para condenarmos muito veementemente o Modelo Padrão. Mas há uma discrepância muito menos condescendente. E tem a ver justamente com os neutrinos. Do modo como está construído, o Modelo Padrão proíbe que os três tipos de neutrinos se transformem entre si. Isso é uma consequência automática da teoria, vinda de um resultado teórico com o charmoso nome de "conservação do número leptônico". Às partículas são associados certos números - no caso dos neutrinos e algumas outras partículas, chamados "números leptônicos" - que deveriam, segundo a teoria, se conservar quando elas se transformam umas nas outras - tal e qual, por exemplo, a conservação da energia. Mas, em 1998, foi descoberto que os neutrinos se transformam uns nos outros.Há, portanto, algo errado com a teoria! E, desta vez, não se trata um desvio minúsculo: estamos falando da existência ou não de todo um fenômeno físico.
Tudo isso significa bastante trabalho excitante à vista para teóricos e experimentais. Estamos vivendo tempos interessantes na física! De novo.
Versão artística de um modelo para a explosão de raios gama GRB 080319B. A explosão lança dois jatos opostos de matéria (em branco e amarelo). Crédito: NASA/Swift/Mary Pat Hrybyk-Keith and John Jones.
2. Com relação à astrofísica dos neutrinos: essas partículas contém informações importantes sobre fenômenos cósmicos pouco conhecidos, tais como as explosões de raios gama (veja a figura ao lado), que estão entre os fenômenos mais violentos já observados no Universo e cuja origem não é bem conhecida. O motivo é que os neutrinos são produzidas em grandes quantidades por tais eventos e interagem pouquíssimo com a matéria, de modo que chegam até aqui com as informações intactas. Assim como no caso da física das partículas, diferentes teorias hipotéticas sobre as causas desses fenômenos podem ser testadas comparando-se suas previsões com as observações dos neutrinos que chegam na Terra.
Além disso, o estudo dos neutrinos pode também ser usado para testarteorias cosmológicas, ou seja, sobre a evolução do Universo como um todo. Como eles são muito numerosos, sua presença por todo o espaço cósmico pode ter influências na formação das galáxias e dos aglomerados de galáxias, que são processos ainda não bem compreendidos. No caso do GEFAN, diferentes teorias possíveis sobre a influência das propriedades dos neutrinos na evolução do Universo são verificadas pela comparação dos resultados de seus cálculos com as observações astronômicas.
Vejamos essas duas vertentes com um pouco mais de detalhe.
Há três tipos de neutrinos. Chamam-se: “neutrino do elétron”, “neutrino do múon” e “neutrino do tau”. Possuem esses curiosos nomes porque, na maior parte das vezes, quando um neutrino do elétron interage com outras partículas, aparece um elétron; quando um neutrino do múon interage, aparece um múon, e assim por diante. Esta é uma manifestação da chamada conservação do número leptônico: léptons da mesma "família" (como "elétrons" e "neutrinos do electron") aparecem em pares. O elétron é bem conhecido; já o múon e o tau são partículas que se transformam em outras apenas uma fração de segundo depois que são produzidas em fenômenos físicos bastante energéticos (como interação dos raios cósmicos com a atmosfera ou experimentos em laboratórios).
Essas seis partículas constituem os léptons, uma das três classes em que são divididos as dezenas de partículas elementares conhecidas (veja o box no fim deste texto). Cada par “partícula”-”neutrino da partícula” é chamado de uma “geração”. Na verdade, cada geração não contém apenas esses pares, mas também um par de quarks, como mostra a tabela no box no fim do texto.
Em 1998, foi descoberto, no laboratório Superkamiokande, no Japão, que os três tipos de neutrinos podem se transformar um no outro. Isso por si só já é algo muito interessante, pois viola a chamada “conservação do número leptônico”, uma das regras que regulam as transformações entre as partículas elementares. Essa lei proíbe que os neutrinos de diferentes tipos se transformem entre si. Logo, ela não está funcionando. Acontece que essa lei é consequência do que sabemos sobre as teorias atuais da física das partículas. Por isso, não parece ser possível abandoná-la sem causar mudanças substanciais no Modelo Padrão. O que está acontecendo? Precisamos mudar nossas teorias ou estamos apenas deixando de enxergar algum detalhe importante? Só o tempo e muitas pesquisas experimentais e teóricas dirão.
Não se entende bem, ainda, por que as oscilações ocorrem, nem como compatibilizá-las com a teoria atual. O grupo tem feito várias pesquisas nesse sentido. Diversas equipes experimentais ao redor do mundo e do IFGW colhem dados com observações de neutrinos (para saber mais sobre eles, veja a página do Grupo de Léptons[ do IFGW).
O GEFAN compara esses dados com as previsões de diversas hipóteses que formulam ou aperfeiçoam sobre a física das partículas. Por exemplo, é possível que existam mais gerações de léptons além das três conhecidas (a do elétron, do múon e do tau). Não se conhece nenhuma restrição da Natureza que explique por que não possa haver mais gerações, ou seja, mais pares “partícula” / “neutrino da partícula”. A existência de mais gerações tem conseqüências teóricas na física das partículas em geral que podem ser comparadas com os dados observacionais.
Outro exemplo é a suposição da existência de novas forças além das quatro conhecidas. Sabe-se hoje que qualquer força física pode ser reduzida a combinações de apenas quatro forças fundamentais: gravitacional, eletromagnética, força forte - a conhecida força nuclear - e força fraca - menos conhecida, mas responsável, por exemplo, pela radiação beta (veja o box no fim deste texto). O grupo tem explorado a hipótese de haver novas forças – as chamadas “interações não-padrão”.
Um dos detectores de neutrinos do Sudbury Neutrino Observatory, no Canadá, que observou pela primeira vez a oscilação em neutrinos vindos do Sol. Observe o tamanho das pessoas perto dele.
Os raios cósmicos são formados de partículas, como núcleos de átomos. Se atingirem a atmosfera com energia muito grande, a reação produz muitas novas partículas - que também, por sua vez, reagem com o ar, e assim por diante, num processo em cascata. Na figura abaixo, vê-se os raios cósmicos produzindo primeiropíons (que são partículas formadas por dois quarks); estes também reagem e produzem múons; estes, por sua vez, produzem elétrons. Como indicado na figura, em cada uma dessas reações, são produzidos também neutrinos.
Fonte da figura: "Atmospheric Neutrinos", Departamento de Física da Universidade de Boston, EUA.
Neutrinos também podem ser produzidos quando raios cósmicos vindos do espaço colidem com as camadas superiores da atmosfera da Terra.
A análise dos dados observacionais sobre esses neutrinos, chamados neutrinos atmosféricos, e a sua comparação com as consequências de diversas hipóteses teóricas sobre os raios cósmicos, permite investigar a natureza dos mesmos. Há bastante campo aberto sobre isso. Para se ter uma idéia, os raios cósmicos mais energéticos têm origem totalmente desconhecida.
É também possível estudar a oscilação com os neutrinos atmosféricos. Além disso, eles são muito bons para se testar teorias novas, pois permitem observar fenômenos envolvendo uma faixa grande de valores de energia, com o valor mais alto até mil vezes que o mais baixo.
Normalmente, pesquisa-se astronomia olhando a luz que os astros emitem e chegam até nós. Mas é possível observar também os neutrinos e outras partículas emitidos por eles, que trazem informações diferentes para nós. É um ramo da astronomia chamado “astronomia de astropartículas”.
As estrelas, por exemplo, emitem muitos neutrinos. Mas eles são úteis mesmo é para se investigar certos fenômenos astronômicos mais raros, muito energéticos e pouco conhecidos. Entre eles estão núcleos ativos de galáxias (núcleos de galáxias que emitem enorme quantidade de energia); explosões de raios gama (os eventos mais energéticos que se conhece; não se sabe o que explode, mas produz imensa quantidade de raios gama); e magnetars (objetos extremamente densos – com cerca de 20 km de diâmetro, mas mais massivos que o Sol - e dotados de campos magnéticos centenas de milhares de vezes mais intensos que os mais poderosos ímãs fabricados na Terra).
Além disso, neutrinos são também úteis para se pesquisar cosmologia (que é o estudo do Universo como um todo - sua origem, seu destino, sua evolução).Como os neutrinos são tão numerosos, suas propriedades podem influenciar a própria evolução do cosmo – ou, no referencial do cientista, podem dar indicações sobre como essa evolução aconteceu. Especificamente: como se dá a expansão do Universo; por que os grandes aglomerados típicos de matéria, como galáxias e grupos de galáxias, têm o tamanho médio que tem (diferentes modelos teóricos produzem aglomerados de diferentes tamanhos médios). Ou como se formou a distribuição geral de matéria no Universo, que parece ter uma estrutura filamentosa entremeada de imensos espaços vazios, parecida com uma esponja.
Um outro problema cosmológico muito misterioso é que nada menos que 85% da matéria do Universo é invisível – não emite luz nem radiação de espécie nenhuma (nem mesmo neutrinos...!) – e sua natureza é totalmente desconhecida. É a chamada matéria escura. Ela parece se distribuir em enormes “chumaços” contínuos do tamanho de galáxias ou ainda maiores, ao invés de constituir aglomerados como a matéria comum, que se junta em planetas, estrelas, galáxias etc. Sua existência é conhecida pelos efeitos gravitacionais nas galáxias ao seu redor. Do que é feita a matéria escura? Ninguém sabe, mas há alguns candidatos. O neutrino, por interagir tão fracamente com a matéria, é um candidato possível para parte da matéria escura, ainda que não possa explicar toda ela. Se toda a matéria escura fosse feita de neutrinos, não observaríamos a estrutura das galáxias como na figura abaixo (que mostra a estrutura geral do Universo observada, com 63.000 galáxias detectadas pelo experimento 2dFGRS). Ou seja, se os neutrinos fossem toda a matéria escura, não poderiam existir as grandes estruturas observadas no Universo...! Mesmo assim, é interessante explorar as consequências da possibilidade de parte dela ser feita de neutrinos. O GEFAN tem pesquisas que exploram as consequências dessas possibilidades.
Resultados da simulação computacional para a evolução do Universo em grande escala para três situações hipotéticas possíveis, relacionadas com três supostas naturezas diferentes da matéria escura. Na primeira, a matéria se concentra menos por causa do campo gravitacional; na última, mais. As figuras de cima mostram os astros vistos "de perto"; as de baixo, a estrutura geral do Universo como um todo - ela é filamentosa, como mostram as observações astronômicas.
Fonte: R. H. Wechsler, SLAC Summer Institute on Dark Matter, Structure Formation Lectures (Agosto de 2007).
Estrutura geral do Universo observada, com 63.000 galáxias, medida pelo experimento 2dFGRS.
Fonte: M.M. Colless, Carnegie Observatories Astrophysics Series, Vol. 2: Measuring and Modeling the Universe, ed. Freedman W.L., Cambridge University Press (2003). Veja também: tese de mestrado de Daniel Francisco Boriero, IFGW/Unicamp (2008), pág. 44-45.
Exemplo de como é estudada a relação da estrutura geral do Universo com a natureza da matéria escura.
A presença maciça de neutrinos no cosmo pode também produzir efeitos gravitacionais sobre a luz, gerando as chamadas “lentes gravitacionais”, distorções na imagem de galáxias distantes.
Recentemente, o grupo tem também interagido com a área experimental, por meio do Projeto Neutrinos-Angra, juntamente com os membros do Grupo de Léptons, também do IFGW. A idéia é montar um aparelho capaz de detectar a atividade a usina independentemente das informações divulgadas. Isso é possível porque o reator nuclear, enquanto funciona, produz grande quantidade de uma partícula levíssima chamada neutrino, que é capaz atravessar as paredes do prédio da usina praticamente como se não existissem. Ao serem analisados, eles fornecem informações sobre o que acontece no reator.
Com isso, é possível ter informações sobre a potência gerada. Isso tem dois objetivos. Um é a segurança e a eficiência da própria usina. O outro é verificar as informações sobre a quantidade retirada e armazenada de plutônio - que normalmente são enviadas pelo governo brasileiro à Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), órgão da ONU que promove o uso pacífico da energia nuclear, desestimula seu uso militar e fiscaliza os programas nucleares dos países.
O projeto, com o apoio da AIEA, é liderado pela Unicamp e pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) e possui convênio com a Eletronuclear; participam também pesquisadores de mais cinco instituições brasileiras, além de outras da Itália, França e Estados Unidos. Esta é uma das primeiras aplicações tecnológicas da física de neutrinos para salvaguardas e não-proliferação nuclear.
Esquema do detector do Neutrinos-Angra. A = o "alvo", constituído de uma tonelada de líquido com pequena porção de germânio (o alvo serve para que os neutrinos interajam com ele e formem novas partículas, como pósitrons e nêutrons, que serão detectadas pelas outras partes); B = detector de raios gama (produzidos pela interação dos pósitrons com os elétrons do material); C = blindagem contra radiação vinda de fora; D = sistema de veto, para eliminar sinais vindos de raios cósmicos que consigam atravessar a blinagem.
Fonte: projeto básico do detector (em PDF) apresentado por Anjos et al.
O mundo é muito complexo, mas suas raízes parecem simples. Toda a diversidade do Universo material parece vir de um conjunto surpreendentemente pequeno de “tijolos” primordiais.
Antes de descrever essa pequena “fauna”, é preciso advertir que nem todas as partículas “servem” para formar átomos e moléculas (como o fazem elétrons, prótons e nêutrons). Muitas delas simplesmente existem por aí, vagando pelo espaço – como os neutrinos, que viajam sozinhos entre estrelas e galáxias praticamente na velocidade da luz. Ou então são produzidas em diversos fenômenos físicos (como na interação de raios cósmicos com a atmosfera da Terra) e desaparecem uma fração de segundo depois, transformando-se espontaneamente em outras partículas. Entre essas últimas estão os múons.
As forças – Toda a variedade de forças físicas parece poder ser reduzidas a combinações de apenas quatro forças fundamentais, que são, em ordem de intensidade: a força forte (a mais intensa, é a conhecida força nuclear), a eletromagnética, a força fraca (menos conhecida, mas responsável por certos tipos de radiação, como a radiação beta) e a gravitacional. Todo o resto pode, de alguma forma, ser descrito por meio de combinações delas.
A matéria – Além disso, toda a matéria conhecida parece ser também combinação de apenas algumas dezenas tipos de partículas elementares. Costumam ser agrupadas em três classes. Duas dessas classes se distinguem pela presença ou não das forças fortes; a terceira tem natureza um tanto distinta. Acompanhemos na tabela abaixo (alguns quadrados na mesma agrupam várias partículas):
Quarks (em roxo) – Interagem entre si e com outras partículas por meio da força forte. Formam os prótons, os nêutrons (cada um formado por três quarks) e outras partículas pesadas. São em número de seis: up (u), down (d), charm (c), strange (s), top (t) e bottom (b). O próton é formado por dois up e um down; o nêutron, por dois down e um up.
Léptons (em verde) – o que os caracteriza é que não interagem pela forçaforte. Mas o fazem pelas outras. São também seis: elétron (e), múon e tau, e mais três tipos de neutrinos - chamados “neutrino do elétron” , “neutrino do múon” e “neutrino do tau”, pois possuem propriedades semelhantes às partículas correspondentes.
Bósons de gauge (em vermelho) – são partículas “mediadoras” das quatro forças fundamentais. Isso significa que essas forças se manifestam, microscopicamente, como fluxos dessas partículas. Por exemplo, forças elétricas e magnéticas se manifestam como fluxos de fótons. As forças fortes se manifestam como fluxos de glúons; e as forças fracas, como fluxos das chamadas partículas Z e partículas W. Supõe-se que à gravitacional também corresponda uma partícula, chamada de gráviton, mas ele ainda não foi observado (não necessariamente porque não exista: sua massa prevista é muito menor do que os instrumentos atuais conseguem detectar).
Além dessas partículas, há também como que “espelhos” delas, chamadas antipartículas.A cada partícula corresponde uma antipartícula, com algumas propriedades invertidas, como a carga elétrica - com exceção do fóton, que pode ser considerado sua própria antipartícula. As antipartículas formam a antimatéria.
Repare-se que, até onde se sabe, o elétron é uma partícula elementar – não tem partes –, enquanto o próton e o nêutron não o são – são formados por três quarks, cada.
Voltemos à tabela. Repare que as partículas são, alternativamente, classificadas em três“gerações” nas três primeiras colunas verticais. (indicadas por I, II e III) Isso porque há certas relações de simetria entre as partículas de uma mesma coluna. Por que há só três gerações é uma das perguntas sem resposta em que os físicos se debruçam hoje.
O GEFAN surgiu a partir de conversas de alguns pesquisadores da área de física de partículas, mas de diferentes especialidades, que gostariam dar ênfase, nas suas investigações, aos neutrinos. Entre eles, estavam Vicente Pleitez, do Instituto de Física Teórica da Unesp, Renata Zukanovich Funchal, da USP, e Marcelo Moraes Guzzo, do Grupo Teórico do IFGW. As reuniões se deram a partir de 1992. Houve um processo de aprendizagem da nova sub-área, começaram a orientar pessoas, pessoas foram enviadas ao exterior e pessoas do exterior foram agregadas à equipe. Um grupo informal foi constituído, com reuniões na Unicamp, na USP e na Unesp, e esses cientistas passaram a colaborar enre si em diversas pesquisas.
A intenção original era usar os neutrinos para testar propriedades fundamentais das partículas elementares relacionadas à teoria atual, o Modelo Padrão. Para isso, os membros do grupo informal que pertenciam ap IFGW constituíram o Grupo de Física e Astrofísica dos Neutrinos. A colaboração com os pesquisadores da USP e da Unesp, por sua vez, continuou.
As pesquisas foram se diversificando com a chegada de novos pesquisadores: foram introduzidas pesquisas com neutrinos de supernovas, neutrinos solares, interações não-padrão e sobre a relação entre neutrinos e a cosmologia.
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