Grupo de Sistemas Dinâmicos (GSD)
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“Sistema dinâmico” é uma expressão bastante ampla – refere-se a qualquer sistema físico que evolua no tempo –, mas em geral é usada quando se estuda sistemas com comportamentos complexos chamados “não-lineares”. Exemplos de comportamentos não-lineares são a auto-organização, a quebra espontânea de simetria e o caos.
Na auto-organização, um sistema passa espontaneamente a apresentar níveis de organização que não possuía antes. Diversas estruturas podem aparecer espontaneamente. Um exemplo é esta simulação em computador da formação de novas espécies biológicas feita pelo grupo, mostrada na figura abaixo. A simulação parte de uma situação totalmente homogênea, na qual todos os indivíduos são da mesma espécie, e introduz pequenas variações em parâmetros que representam seus genes.
Com o tempo, a partir de uma situação em média homogênea, aparecem diferenciações espontâneas que produzem concentrações de espécies diferentes em diferentes regiões geográficas. Isso acontece porque as pequenas variações aleatórias nos códigos genéticos que o programa introduz aos poucos podem se amplificar e produzir as grandes concentrações coloridas da figura, ao invés de produzir apenas misturas de indivíduos pouco diferentes.
Curiosamente, isso acontece mesmo partindo-se de uma população totalmente homogênea. É a “quebra espontânea de simetria” (no caso, quebra da homogeneidade inicial). Esse fenômeno aparece em diversas outras situações, como em engarrafamentos de trânsito que acontecem espontaneamente mesmo sem acidentes ou outras perturbações.
Resultado da simulação de especiação. À medida que o tempo passa, novas espécies vão surgindo, representadas pelas diferentes cores, e ocupando regiões geográficas distintas
Fonte: M. A. M. de Aguiar, M. Baranger, E. M. Baptestini, L. Kaufman and Y. Bar-Yam, Nature 460 (2009) 384
As simulações computacionais são uma espécie de “física teórica experimental”: um programa simula o que acontece na Natureza de forma aproximada; variando os parâmetros escolhidos pelo programador, pode-se investigar o que acontece em vários casos possíveis. Se os resultados concordarem com o que é observado, pode-se compreender parte do que ocorre na própria Natureza real (por exemplo, descobrir que espécies novas podem surgir por auto-organização).
Tradicionalmente, consideram-se como necessárias para a formação de novas espécies biológicas (a “especiação”) a seleção natural de Darwin e a influência do isolamento imposto por barreiras naturais (altas cadeias montanhosas, oceanos ao redor de ilhas etc.). Porém, esses modelos físico-matemáticos mostram que, mesmo sem a presença desses fatores, a especiação pode acontecer espontaneamente por auto-organização.
Trata-se de uma hipótese chamada “teoria neutra”, lançada em 2001 por Stephen Hubbel (chama-se “neutra” porque trata as espécies em pé de igualdade com relação ao seu comportamento, diferentemente de teorias não-neutras como a dos “nichos”).
Nesse tipo de pesquisa, a idéia é tentar reproduzir características reais do mundo natural por meio de simulações computacionais, com softwares feitos pelo grupo ou em parceria com outros pesquisadores.
Um dos principais desafios futuros do grupo nessa linha de pesquisa é aumentar a interação com os biólogos para aperfeiçoar ainda mais esses modelos, incluindo novos elementos, como os diversos fenômenos que acontecem com os cromossomos durante a reprodução (cross-over, linkage, pareamento etc.). Os modelos ainda são um tanto abstratos e genéricos e podem embutir mais elementos da realidade.
O terceiro tipo de fenômeno não-linear citado no início deste texto é o caos. Em linguagem coloquial, “caos” significa algo como “desordem completa”. Mas, na física e na matemática, trata-se de um termo geral para processos com extrema sensibilidade às menores perturbações: uma pequena alteração na situação inicial provoca alterações dramáticas na evolução do sistema, de modo a fazê-la parecer aleatória.
"Caos" é um termo da física e da matemática que se refere a fenômenos extremamente sensíveis a perturbações mínimas. Normalmente, imaginamos que efeitos sejam mais ou menos proporcionais às suas causas: se uma grande pedra rola de um barranco e no meio do caminho esbarra em um mísero cascalho, a alteração de sua trajetória será minúscula. No entanto, em muitos casos essas minúsculas perturbações podem ampliar-se e tornar o resultado do fenômeno virtualmente imprevisível. É o popular “efeito borboleta”. A diferenciação das espécies biológicas acima é um exemplo.
O caos envolve também o fenômeno da quebra espontânea de simetria, já discutido, e os ditos fenômenos emergentes. Nestes últimos, estruturas bastante complexas aparecem como resultado de interações simples. Muitos cientistas consideram que a vida é um fenômeno emergente, pois as leis que regem as ligações químicas entre moléculas, em que a bioquímica se baseia, são relativamente simples.
Há muitos exemplos simples de sistemas caóticos; acontece com pêndulos duplos, como na figura ao lado – mudanças mínimas na posição inicial em que é largado alteram totalmente a sua trajetória após poucos segundos –, e também em hidráulica, astrofísica, meteorologia, economia e muitas outras áreas.
Fonte: Wikipedia
O grupo estuda de forma teórica o caos em conexão com a física quântica, uma parte da física normalmente adequada para descrever sistemas extremamente pequenos (átomos, moléculas, partículas subatômicas). A física clássica, por sua vez, descreve a maior parte do mundo macroscópico não demasiadamente distante do nosso cotidiano (veja box abaixo).
A física quântica foi desenvolvida principalmente entre 1900 e 1927 para descrever e explicar fenômenos que dependem crucialmente do comportamento dos átomos, moléculas e entidades ainda menores. Ela substituiu a física clássica (que é a que descreve bem a maior parte do mundo macroscópico e que é basicamente a física que aprendemos no colégio), que falha para esse tipo de fenômeno.
Na descrição quântica, as posições e as velocidades de moléculas, átomos e corpos menores possuem certa indeterminação – que não é causada simplesmente pela imprecisão dos aparelhos (como na física clássica), mas parece ser intrínseca à sua natureza. Por causa disso, enquanto a física clássica descreve o movimento em termos das trajetórias que as partículas fazem, a quântica as descreve com entidades matemáticas chamadas “funções de onda”, que dão informação sobre a probabilidade de se encontrar a partícula em determinada posição e com determinada velocidade. Por tudo isso, o conceito de trajetória não existe em mecânica quântica.
A abordagem que o grupo faz dos fenômenos caóticos se dá na interface entre a física clássica e a mecânica quântica. Dentre as técnicas físico-matemáticas de abordagem teórica dos diversos problemas físicos, há uma chamada aproximação semiclássica, que é uma espécie de “compromisso” entre a física quântica e a física clássica. Uma situação “intermediária”. No entanto, a diferença entre a física quântica e a física clássica não se resume apenas ao fato de os resultados de suas equações serem diferentes: há fenômenos físicos inteiros que aparecem em uma e não aparecem na outra. O caos é um exemplo: aparece na física clássica, mas não na quântica. O inverso também acontece, como o tunelamento, que é passagem de uma partícula por uma barreira ou obstáculo totalmente impenetrável na física clássica (imagine, por exemplo, um carrinho de montanha russa sem velocidade suficiente para chegar ao topo de uma subida).
Ora, o que acontece então se a aplicarmos a esses fenômenos “críticos”, nos quais as duas são irredutíveis entre si? O grupo tem investigado essa pergunta em vários casos, como no efeito túnel e no “caos quântico”.
O caso é que a física clássica pode ser vista como uma aproximação da mecânica quântica: podemos, se quisermos, estudar o movimento de uma bola de gude com a quântica – seus resultados serão indistinguíveis (ainda que muito mais trabalhosos) que os da física clássica. Mas não podemos estudar o movimento de um elétron com a física clássica, só com a quântica.
Bem, acontece que o caos só aparece na física clássica, não na quântica. Então, de alguma forma o caos deve emergir se abordarmos sistemas macroscópicos com a quântica. Ora, como o caos pode emergir de uma teoria na qual ele não existe?
Essa é uma das questões investigadas por essa linha de pesquisa. A aproximação semiclássica é então usada para extrair um compromisso entre a clássica e a quântica em situações nas quais elas parecem irredutíveis. E, assim, compreender melhor o mundo quântico, o clássico e o próprio caos.
O grupo foi formado pouco depois da chegada de Marcus Aguiar no Instituto de Física, em 1989, quando o trabalho de alguns pesquisadores do Departamento de Física do Estado Sólido do Instituto de Física passaram a concentrar-se no “caos quântico” (ou, para ser exato, sistemas quânticos cujos correspondentes clássicos exibem caos).
Vários trabalhos importantes do grupo foram feitos no fim dos anos 1990 pelos professores Marcus Aguiar, Kyoko Furuya e seus colaboradores. Em particular, foram dadas contribuições fundamentais na área de emaranhamento quântico e sua relação com o caos clássico subjacente. Posteriormente, os trabalhos se diversificaram, envolvendo as aproximações semiclássicas num nível mais fundamental, com a utilização dos chamamos estados coerentes e suas aplicações em dinâmica quântica. Mais recentemente vários estudos tem sido desenvolvidos na área de sistemas complexos, teoria de redes e nas aplicações à dinâmica de populações, como as teorias neutras sobre formação das espécies.
Modelo simula formação de várias espécies (Luiz Sugimoto) - Jornal da Unicamp 438, agosto de 2009.
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