O Grupo de Neurofísica investiga a dinâmica cerebral por meio de técnicas como a ressonância magnética (RM), a eletroencefalografia (EEG), a tomografia ótica (TO) e a tomografia computadorizada por raios X (TC). A ideia é estudar tanto a condição cerebral normal quanto a patológica, a fim de se compreender melhor as estruturas e funções cerebrais.

Grupo de Neurofísica (GNF)

Embora as patologias estudadas sejam variadas, o foco está nas epilepsias, por causa do seu potencial para a investigação científica, - a investigação de suas causas pode fornecer elementos importantes para a compreensão do funcionamento do cérebro -, da quantidade de pesquisas feitas sobre o tema e da sua atualidade científica. O termo “epilepsia” refere-se, na verdade, a um conjunto amplo de dezenas de quadros clínicos com muitas características diferentes (e que nem sempre incluem as famosas “crises”).

Assim, a principal linha de pesquisa do grupo consiste em combinar as técnicas mencionadas no início deste texto - ou seja, fazer uma abordagem multimodal. Isso permite extrair distintas informações da dinâmica cerebral, tanto em situação normal quanto patológica. Cada uma dessas técnicas utiliza-se de princípios físicos específicos, o que possibilita múltiplas formas de interação com o tecido cerebral, permitindo extrair do cérebro informações anatômicas e funcionais; estáticas e dinâmicas; elétricas, hemodinâmicas (relacionadas com o fluxo sanguíneo) e metabólicas.

Para realizar essas pesquisas, o grupo interage principalmente com pesquisadores da Faculdade de Ciências Médicas (por meio do Departamento de Neurologia e do Laboratório de Neuroimagem), do Instituto de Computação e da Faculdade de Engenharia Elétrica da Unicamp. Há ainda articulação estreita com a Cooperação Interinstitucional de Apoio a Pesquisas sobre o Cérebro (CInAPCe), que envolve Unicamp, USP, Unifesp e o Hospital Israelita Albert Einstein.

As técnicas e os métodos

Grosso modo, podemos dividir os estudos e técnicas desenvolvidos pelo grupo em anatômicos e funcionais.

Os estudos anatômicos consistem em realizar análises matemáticas de imagens da anatomia cerebral (obtidas com ressonância magnética ou com tomografia por raios X), para descobrir como se pode distinguir as diversas situações patológicas – ou seja, que parâmetros no cérebro se devem observar para se conseguir distingui-las.

Já nos estudos funcionais, o objetivo geral é acompanhar os processos dinâmicos que ocorrem no cérebro, decorrentes de algum processamento cognitivo, sensorial ou motor. As duas abordagens estão interligadas: por exemplo, as imagens anatômicas também servem de referência para os estudos funcionais.

No caso dos estudos funcionais, os equipamentos usados são capazes de obter três tipos de sinais (ou seja, informações):

  • elétricos (dos impulsos nervosos), coletados pela eletroencefalografia;
  • hemodinâmicos (relacionados à corrente sanguínea), coletados pela tomografia ótica e pela ressonância magnética funcional;
  • metabólicos (relacionados à neuroquímica cerebral), coletados pela espectroscopia por ressonância magnética.

Com esses sinais, pode-se montar mapas funcionais, que indicam o que está acontecendo em cada momento no cérebro em termos de impulsos nervosos, de circulação sanguínea e de concentração das diversas substâncias que participam do metabolismo cerebral (os metabólitos).

A ressonância magnética

ressonância magnética

A ressonância magnética permite a obtenção de imagens de diversas seções do corpo, como as três indicadas acima.
Fonte: Tese de doutorado de Rickson Coelho Mesquita, IFGW/Unicamp (2008), pág. 8

O método mais usado no grupo é o da ressonância magnética (RM), cujo aparelho encontra-se no Hospital de Clínicas da Unicamp. Isto porque a RM é uma técnica muito versátil que permite diversos tipos de abordagens, além de fornecer informações sobre a estrutura (as imagens anatômicas, como normalmente se vê em hospitais – vide figura acima) e sobre a dinâmica cerebral (os mapas funcionais).

A RM também permite obter informações sobre a composição química dos tecidos (por meio da espectroscopia por ressonância magnética) e, mais recentemente, mapear as fibras nervosas cerebrais através de uma técnica conhecida como DTI (“Diffusion Tensor Imaging”, Imagem por Tensor de Difusão).

Outras técnicas

Como funciona a tomografia ótica

Como funciona a tomografia ótica: a luz que entra no córtex, ao difundir-se, pode voltar para o detector, como acontece com os caminhos vermelho (c) e azul (a).
Fonte: Tese de doutorado de Rickson Coelho Mesquita, IFGW/Unicamp (2008), pág.26.

Outro método para estudar o cérebro, além da RM, é o da tomografia ótica. Neste, incide-se luz sobre o couro cabeludo. A luz é de uma frequência para a qual a matéria orgânica é parcialmente transparente (está na faixa do infravermelho próximo da luz visível). Assim, a luz penetra no cérebro e difunde-se nele, sem causar danos. Difundindo-se em todas as direções, uma parte da luz acaba alcançando novamente o couro cabeludo e é então captada por detectores de fótons (veja a figura ao lado). Essa luz que entra e sai traz informações sobre a oxigenação do tecido cerebral até uma profundidade de cerca de 2 centímetros, suficiente para se estudar o córtex.

Também são usadas combinações dos três tipos de equipamentos (eletroencefalografia, ressonância magnética e tomografia ótica). São o que se chama “métodos multimodais”. Desde 2005, o grupo trabalha com uma associação dos dois primeiros equipamentos, chamada EEG-fMRI (o “fMRI” é de “functional Magnetic Ressonance Imaging”, Imagem por Ressonância Magnética Funcional). A ideia é explorar a complementaridade dos dois métodos associados. Primeiro, porque o EEG possui boa precisão temporal (informa bem em que momento os fenômenos acontecem), mas pouca precisão espacial (informa mal em que parte do cérebro eles acontecem), enquanto a fMRI tem as características contrárias. E segundo, porque a EEG capta sinais elétricos e a fMRI, hemodinâmicos.

Com exceção do equipamento de RM, os demais são protótipos. Pesquisas científicas são muitas vezes feitas com instrumentos parcialmente artesanais (quando não totalmente), pois devem ser adequados aos propósitos específicos da investigação. Contudo, através do Programa CInAPCe, o Grupo de Neurofísica tem um convênio com a Philips, pelo qual os membros do grupo têm total acesso ao funcionamento detalhado do sistema de RM, de forma que novos métodos, processos e equipamentos possam ser desenvolvidos, produzindo inovação tecnológica.

Novos desafios

Duas ideias para os próximos passos são (1) construir modelos teóricos do funcionamento do cérebro com base nos resultados desses estudos e (2) adaptar outras combinações dos três métodos principais. No momento, o grupo está aperfeiçoando a combinação do EEG com a tomografia ótica (EEG-NIRS, de “Near-Infrared Spectroscopy”, Espectroscopia no Infravermelho Próximo). Pensa-se também em combinar os três: o EEG, a ressonância magnética e a tomografia ótica. A construção de modelos teóricos baseados nos resultados dessas investigações também é um desafio futuro do grupo.

História do Grupo

O Grupo de Neurofísica surgiu articulado com a Cooperação Interinstitucional de Apoio a Pesquisas sobre o Cérebro (CinAPCe). Esta cooperação surgiu de interesses em neurociência de pessoas do Instituto de Física da Unicamp, como Roberto Covolan, atualmente líder do Grupo de Neurofísica, e também do interesse do grupo do Laboratório de Neuroimagem da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, em criar um programa multicêntrico de pesquisa multidisciplinar na área de neurociências. As conversas começaram no fim dos anos 1990, entre Covolan e Fernando Cendes, da FCM. A articulação incluiu também Li Li Min e Mário Saad, da FCM, e Carlos Henrique de Brito Cruz, do Instituto de Física.

Quando ficou claro que o CInAPCe estava com programas de financiamento solidamente estabelecidos, Covolan e Gabriela Castellano, outra cientista incluída no grupo, passaram a aceitar orientandos, a partir de 2004 e 2005. Pouco tempo depois, a criação formal do grupo foi proposta para a direção do Instituto de Física.

O Grupo de Neurofisica é hoje o veículo institucional pelo qual o Instituto de Física da Unicamp se insere no Programa CInAPCe. Muitas das suas pesquisas são feitas em conexão com os estudos dessa Cooperação. O grupo foi o primeiro do Brasil a utilizar métodos óticos (NIRS) e a técnica conjugada EEG-fMRI (esta em colaboração com o Laboratório de Neuroimagem) em estudos funcionais do cérebro.

Saiba mais

Imagens do cérebro em ação - Ciência Hoje 197 (2003)

Técnicas de processamento de imagens por tomografia computadorizada - ComCiência, 10/06/2009>
http://www.comciencia.br/comciencia/handler.php?section=8&edicao=47&id=589

CInAPCe - Projeto multi-modal para o estudo do cérebro - ComCiência, 10/07/2002
http://www.comciencia.br/reportagens/epilepsia/ep23.htm