A formação da equipe de Estado Sólido
Sérgio Porto, Cerqueira Leite e um time no estado sólido
Um quarto fator favorável foi um específico: a existência do grupo articulado de ex-alunos brasileiros altamente qualificados que Sérgio Porto conseguiu levar para a Bell Labs e que estavam ávidos para voltar. Emigraram em grande parte durante o período de intensa fuga de cérebros do período JK, descrito acima. Em 1968, eles já estavam espalhados por várias instituições dos EUA, mas continuavam se comunicando. Segundo um depoimento de um deles (José Ripper Filho, para a pesquisadora Daniela Cristina Lot Lavandeira), eram liderados informalmente por Rogério Cézar de Cerqueira Leite. Ligava-os a trajetória comum - a maior parte deles se conheceu no ITA e trabalhou na Bell Labs - e o interesse em retornar ao seu país em conjunto para formar uma "massa crítica" já desde o início, tendo em vista a dificuldade em pesquisa em estado sólido aqui. A vinda desse grupo transformaria radicalmente o perfil e a dimensão das pesquisas no IFGW.
Sérgio Porto
Porto, então, já era um cientista de prestígio internacional, como já visto acima. Desde 1967, trabalhava na Universidade do Sul da Califórnia (USC). Os contatos com a Unicamp já existiam: um dos físicos unicampestres vindos de Rio Claro, Carlos Argüello, tinha, na mesma época, sido seu aluno de doutorado na Bell Labs; pouco depois, Zoraide Argüello também o seria (defendeu sua tese em 1970). Articulações entre ele, Zeferino Vaz e Marcelo Damy para trazer o grupo todo para o IFGW começaram pelo menos desde 1968.
Alguns membros do grupo procuraram voltar ao Brasil antes. Já se falou das tentativas de Cerqueira Leite no ITA, na UnB e na USP por volta de 1965. Os intentos de vários dos membros restantes colapsaram de vez com a decretação do AI-5, em dezembro de 1968, que fechou drasticamente o regime político no país.
A grande volta
Mas as coisas acabaram dando certo. Vimos acima as gestões do próprio governo para trazer de volta cientistas emigrados para o estrangeiro. Cerqueira Leite chegou no início de 1970 e começou a preparar o terreno para a vinda dos outros, que foram aparecendo ao longo dos dois anos seguintes. Carlos Argüello, quando estava nos Estados Unidos pouco antes, também participou dos convites, tendo chamado Roberto Luzzi em março de 1969; este chegou na Unicamp em janeiro de 1971 e começou a trabalhar com a parte teórica da Física do Estado Sólido. Nelson de Jesus Parada, que instituiria o curso de pós-graduação no Instituto, chegou no mesmo ano (tinha voltado ao Brasil antes, só que para a USP) e passou a participar das articulações.
Sérgio Porto disse a seus colegas e alunos que primeiro "arrumassem a casa" e que viria só quando isso estivesse feito – conforme consta na memória de várias pessoas que testemunharam aqueles tempos. Impôs condições: laboratórios com edificação própria para pesquisas em Eletrônica Quântica (como se chamava, na época, esta sub-área da Física do Estado Sólido), verba de 2 milhões de dólares para as pesquisas e a aquisição de equipamentos, ida para a Unicamp de cerca de 30 PhD em Física brasileiros e estrangeiros que trabalharam e trabalhavam com ele na Bell Labs e na USC.
As condições foram aceitas pelo ministro do Planejamento, João Paulo dos Reis Velloso, e, em março de 1974, Sérgio Porto retornava efetivamente ao Brasil. O prédio que ele exigiu passou a ser construído e, em 11 de setembro de 1976, era inaugurado do Departamento de Eletrônica Quântica, já no novo campus, em Barão Geraldo.
Inauguração do Departamento de Eletrônica Quântica (DEQ), em setembro de 1976. De costas, em primeiro plano, o reitor Zeferino Vaz
Outros nomes importantes desse grupo foram José Ripper Filho (que fundaria pouco depois o Departamento de Física Aplicada), Regis Scarabucci (que foi para a Faculdade de Engenharia Elétrica da Unicamp, que ajudou a fundar), José Busnardo Neto e Paulo Sakanaka (que iniciou a área de plasma no IFGW).
A maior parte desses cientistas iniciou linhas de pesquisa envolvendo lasers de alguma forma, incluindo o estudo de propriedades de materiais e o uso do laser na medicina - e também a pesquisa sobre os diversos tipos de lasers em si, para aperfeiçoá-los. Mas também houve pesquisas com Física da Matéria Condensada teórica e várias outras linhas, como veremos nas seções 11 e 12.