Laura H. Greene, cientista chefe do National High Magnetic Field Lab - Florida State University, ministrou nessa quarta-feira, 13 de março de 2019, no auditório do IFGW o Colóquio Extraordinário promovido pela Pós-Graduação do Instituto. 

Na apresentação intitulada “And, I am a Materials Girl...” numa alusão bem-humorada à canção quase homônima da famosa cantora americana Madonna, a palestrante se propôs a oferecer um bate-papo de encorajamento para as “meninas” que querem fazer ciência...a começar pelo elegante vestido que trajava com a estampa da Tabela Periódica dos Elementos. Minutos antes do início, Laura contou que, em suas andanças mundo a fora, tem se deparado com boas iniciativas para que o número de mulheres e outras minorias nas ciências aumente. “O Brasil está avançando nesse tema, se compararmos com tantos outros países. Penso que é na diversidade que se aprende a respeitar o outro. Que aborrecido seria viver em um mundo em que as pessoas tivessem todas o mesmo ponto de vista sobre os assuntos, e na ciência não é diferente”, observou Laura. Comentou ainda que a American Physical Society (APS) e a IEEE disponibilizam em seus websites vários programas e projetos para o incentivo à participação de mulheres, LGBTs e outras minorias nas ciências físicas e nas engenharias.

 A Profa. Mônica Cotta apresentou a palestrante falando sobre a sua brilhante carreira. Comentou que logo no início da semana ela soube que Laura estaria em um Workshop sobre “Mulheres na Ciência” na USP em São Carlos, SP, entre os dias 14 e 15 de março. Trocou e-mails com a palestrante e acertou a sua vinda para a Unicamp. “Trata-se de um Colóquio Extraordinário por conta de termos organizado assim, em cima da hora. Agradecemos imensamente a Laura por estar aqui conosco depois de uma longa viagem. Ainda hoje ela irá para São Carlos”, finalizou.

Laura contou que desde muito pequena se interessava por ciências, que era fascinada pelas aulas onde aprendia sobre o sistema solar e os planetas. “Ainda assim eu fui muito desencorajada pelos meus pais a seguir uma carreira científica. Pensavam que, assim como um músico, um físico não conseguiria um emprego”. Comentou que hoje entende o posicionamento de seus pais que, de certa maneira, queiram protegê-la. Em 1970 ela era a única estudante de Física na Ohio State University e em 1974, depois de concluir o Bacharelado, começou a trabalhar na Hughes Aircraft, no departamento de engenharia da empresa. Eles precisavam, por força de lei, ter duas mulheres em seus quadros, e Laura era uma delas. “Aprendi muito nessa área de engenharia, mas havia um físico para o qual eram endereçadas todas as questões científicas da empresa. Então eu pensei: eu quero ser essa pessoa! ”, relembrou a pesquisadora. Laura então abdicou de seu alto salário e de sua vida confortável no Sul da Califórnia e se inscreveu para o curso de pós-graduação em Física na Cornell University. Como era um caso de transferência da Ohio State University, sua inscrição foi rejeitada porque justamente naquele ano a Cornell University não aceitaria estudantes com essa modalidade de ingresso. Laura então, acompanhada de um amigo, saiu dirigindo de Columbus, Ohio e foi até Ithaca, NY – o que é um percurso e tanto -  para conversar com o chefe do departamento de Física e convencê-lo a aceitar a sua transferência. “Então eu disse: ‘Vocês precisam me aceitar! ’, tamanha era a minha vontade de estudar ali. Devo ter sido convincente porque eles me aceitaram e lá passei seis anos muito produtivos como estudante de pós-graduação”, comentou.

Uma das suas primeiras ações nesse início foi criar uma Associação de Mulheres na Física com quatro membros inicialmente. Elas se reuniam a cada uma ou duas semanas. Os professores perguntavam: “Sobre o que vocês conversam, meninas? ”... E ficavam surpresos quando elas respondiam que discutiam sobre Física. “Está certo que conversávamos sobre nossas vidas, trocávamos receitas, mas o cerne das conversas era sobre nossos trabalhos em Física. E somos amigas até os dias de hoje, por mais de quarenta anos”, observa Laura. Nessa época não se falava em assédio sexual ou má conduta no trabalho. Éramos aconselhadas a não dar importância a esse tipo de situação e a seguir em frente com o trabalho. Depois de muitos artigos publicados e já estando no final de seu doutorado em 1984, ocorreu um episódio importante, sob esse aspecto, na carreira de Laura: o professor chefe do laboratório onde trabalhava lhe disse que se esforçaria o quanto pudesse para que ela não conseguisse um emprego. Deveria ser somente pelo fato de ser mulher. Nessa mesma época, cientistas do Bell Labs foram até a universidade para recrutar estudantes e Laura havia se inscrito no processo. Na noite anterior à entrevista, esse professor foi até a sua sala e lhe contou que já havia conversado com os recrutadores e que ela não iria conseguir o trabalho. “Quando ele saiu de minha sala eu desabei em lágrimas, então eu me acalmei e pensei: eu não vou desistir! Durante a entrevista eu argumentei que sabia da conversa que haviam tido com o professor e lhes entreguei uma lista de contatos de vários outros cientistas com os quais eu havia trabalhado e sugeri que conversassem com eles. Consegui o trabalho! ”, completou Laura. Em 1992, devido às mudanças promovidas nos laboratórios industriais nos USA, Laura deixou o Bell Labs e ingressou no Departamento de Física da Faculdade de Illinois como professora. Mais tarde, em 2015, se aposentou da arte de ensinar e foi trabalhar com pesquisas no National High Magnetic Field Lab, onde está até hoje.

Laura disse que é interessante que pessoas que têm o mesmo interesse se juntem, principalmente se são minorias nos seus espaços de atuação. “A força de um vem da força de todos. Troquem e-mails entre si, conversem eletronicamente, se encontrem de vez em quando”, aconselhou a pesquisadora.

A seguir Laura apresentou um slide sobre o código de conduta para as reuniões e outro sobre os programas desenvolvidos especialmente para as mulheres da American Physical Society (APS) os quais estão disponíveis no website da APS e no das Mulheres na Física.

Quando ela ingressou como professora em Illinois, ela resolveu se engajar na luta das minorias nas ciências e nas engenharias e começou a estudar os dados estatísticos dessa área e a pensar como poderia contribuir nessa causa.

Na sequência mostrou os resultados da pesquisa “Beyond representation: data to improve the situation of women and minorities in Physics and Astronomy” conduzida por Raquel Ivie contendo dados de turmas que se formaram nos Estados Unidos, desde 1980 a 2015, nas diversas áreas da ciência, com ênfase nas carreiras de Física e Astronomia. Em 1980 cerca de 10% e 12% dos alunos eram mulheres nas engenharias e na Física. Esse número foi aumentando e se está agora em cerca de 20%, mas com tendência de crescimento. Esses números não são muito diferentes quando se trata dos alunos de pós-graduação. Para os alunos de Ensino Médio matriculados na disciplina Física esse número é de quase o dobro. “Então fica a pergunta: porque as meninas se desinteressam pela Física quando vão entrar na Universidade? Não sabemos as respostas, mas podemos realizar ações de divulgação nas escolas para tentarmos reverter esses números. A APS promove inúmeras iniciativas que podem ser replicadas no mundo inteiro”, comenta.

Dando prosseguimento, ela comentou que as sociedades científicas americanas estão reformulando suas normas de conduta visando diminuir os casos de assédio sexual e má conduta. “Todos os cientistas sempre estiveram preocupados com más condutas de plágio e falsificação de dados. Está na hora de discutirmos e prestarmos mais atenção às más condutas relacionadas ao assédio sexual as quais têm tudo a ver com relação de poder entre os cientistas”, explica. Laura faz parte do grupo de trabalho da APS que está discutindo esses temas e informou que muito em breve serão apresentados oficialmente os resultados para os membros através do website da associação. Laura contou que, depois de ter ouvido muitos relatos, é muito constrangedora a situação para a mulher que sofre o assédio. É difícil admitir e denunciar. “A vítima do assédio é sempre tida como culpada ‘Não deveria ter agido assim ou assado, ter se vestido com essa ou aquela roupa, ou ter falado isso ou aquilo’ e esse pensamento não é correto e ético. Temos que encorajá-las a denunciar, acolher sua reclamação, tomar providências e ao mesmo tempo dizer que a vida continua, que seus estudos e pesquisas não devem ser interrompidos ou pausados por causa dessa situação. Devemos dar feedback mostrando que realmente estamos trabalhando no seu caso e também para diminuir a ocorrência desses episódios. Ações efetivas devem ser tomadas. Situações assim não podem ser mais admitidas ou acobertadas no nosso meio”, enfatiza Laura.

Terminou sua apresentação agradecendo a oportunidade e aconselhando a promoção de ações de divulgação para o aumento de estudantes nos cursos de Física. “Com o aumento do número de estudantes em geral, as meninas vão se apresentar e seu número também vai aumentar”, finalizou.

Depois de responder a várias perguntas da audiência foi aplaudida com entusiasmo pelos participantes. Realmente foi uma tarde muito proveitosa, fechando com chave de ouro as comemorações do Dia Internacional da Mulher no IFGW em 2019.

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