O Grupo de Léptons faz pesquisas experimentais sobre partículas subatômicas. Boa parte é feita em colaboração com instituições de pesquisa de outros países, como o CERN, em Genebra, o Fermilab e o Laboratório de Brookhaven, nos EUA, o LVD na Itália e o projeto internacional Pierre Auger. O nome é histórico: o primeiro interesse do grupo foi a pesquisa sobre neutrinos, classificados como léptons.

Grupo de Léptons (GL)

Ainda há muito para se conhecer sobre as partículas elementares. O que já está claro é que a teoria atual, chamada prosaicamente de “Modelo padrão” e que remonta ao início dos anos 1970, é insuficiente, apesar de funcionar muito bem para inúmeros casos. É cada vez mais intensa a busca de fenômenos que contradigam essa teoria e da verificação de previsões suas ainda não testadas (como a existência de uma partícula ainda não observada chamada bóson de Higgs), para que se possa ter dicas sobre como melhorá-lo.

Mas as partículas elementares são importantes também para se compreender outros fenômenos pouco conhecidos, em particular os astrofísicos. O motivo é que elas são produzidas em grande quantidade em diversos eventos cósmicos, como a produção de energia das estrelas, as supernovas (grandes colapsos estelares) etc. E trazem informações sobre esses fenômenos, complementares às que podem ser acessadas observando-se luz, raios-X etc., como se faz com telescópios em geral.

Como se estudam partículas elementares

O grupo investiga as partículas de três maneiras.

1) O que acontece se jogarmos uma contra a outra? - A primeira maneira é fazerem-nas colidirem entre si em grandes máquinas chamadas aceleradores de partículas. Nesses aparelhos, elas são aceleradas dentro de tubos, que podem ter de vários metros a alguns quilômetros de comprimento, e colidem com alvos, que podem ser pedaços de algum material (“choques com alvo fixo”) ou então outras partículas, aceleradas em sentido contrário (“alvo móvel”). Analisa-se então o que acontece após as colisões. Elas provocam reações que produzem novas partículas, as quais são captadas por detectores e analisadas.

Megafísica - Como essas pesquisas usam aceleradores e detetores muito grandes e caros, é comum que várias instituições de vários países se juntem para formar grandes equipes internacionais, que podem chegar a mais de 1000 pessoas, para usar os equipamentos de um único local. Abaixo, vê-se detectores e magnetos usados por quatro colaborações internacionais das qualiso Grupo de Léptons faz parte: as do Star (EUA), do Alice (Suíça/França), do LVD (Itália) e do Minos (EUA). Compare com o tamanho de pessoas e escadas perto da aparelhagem.

Detector do Star

Detector do Star

Magneto do Alice

Magneto do Alice

Detector de Neutrinos do LVD

Detector de Neutrinos do LVD

Detector de neutrinos do Minos

Detector de neutrinos do Minos (ao fundo, cinzento) na mina de Soudan, com o mural de autoria de Joe Gianetti

Instalações de quatro laboratórios com os quais o Grupo de Léptons colabora ajudando a analisar os dados coletados

2) Olhe para o céu - A segunda forma de se investigar partículas elementares é observar as que “bombardeiam” a Terra vindas do espaço: lançadas pelo Sol ou saídas das profundezas da galáxia. As mais interessantes são estas últimas, que constituem os chamados raios cósmicos. Esses raios são compostos de diversas partículas, como prótons e neutrinos. Quando chegam na Terra, eles reagem com os átomos das camadas superiores da atmosfera, o que produz novas partículas – às vezes em enorme quantidade (os “chuveiros”), o que acontece quando a energia da partícula que chega do espaço é muito grande. A observação dessas partículas secundárias, ou mesmo das partículas que sobrevivem através da atmosfera, como os neutrinos e os múons, revela informações importantes sobre a física subatômica (e também sobre os eventos cósmicos que as produziram). O Brasil possui tradição nos estudos sobre raios cósmicos, que estão na origem das pesquisas sobre física das partículas aqui.

Aceleradores x raios cósmicos - A vantagem dos aceleradores é que, neles, os experimentos podem ser feitos de forma controlada. O problema é que são caríssimos. Já os raios cósmicos, além do preço, têm a vantagem de conterem partículas com energias muito maiores que o possível para qualquer acelerador. As mais energéticas já detectadas em raios cósmicos - em 1991, nos EUA - possuem vinte milhões de vezes mais energia do que o maior acelerador do mundo, o LHC, pode alcançar. Os dois métodos, portanto, se complementam.

3) Olhe para... as usinas nucleares - Há um terceiro método, que usa reatores nucleares. Podem ser os mesmos usados em usinas nucleares, ou então reatores de pesquisa, com urânio um pouco mais enriquecido. Os reatores, enquanto funcionam para produzir energia, emitem também grande quantidade de partículas elementares, como neutrinos e nêutrons. Portanto, são usados como fontes dessas partículas para as pesquisas.

O plasma quark-glúon

Um dos resultados que o Alice procura é encontrar um novo estado da matéria extremamente quente chamado plasma quark-glúon. Nele, não só os átomos separam-se em núcleos e elétrons, e os núcleos em prótons e nêutrons, mas também os próprios prótons e nêutrons permanecem separados em seus constituintes, os quarks. O plasma quark-glúon é previsto teoricamente, mas nunca foi observado sem controvérsia. O estado muito energético necessário pode ser alcançado momentaneamente em colisões muito fortes, e é provável que o LHC venha a conseguir isso.

As pesquisas com aceleradores

Chocando-se à velocidade da luz - Uma das linhas de pesquisa com aceleradores faz colidir não exatamente partículas elementares, mas núcleos inteiros de átomos (como de ouro ou de cobre), formados cada um por dezenas de prótons e nêutrons. Como é difícil retirar todos os elétrons dos átomos para deixar os seus núcleos isolados, muitos elétrons vão junto, e tem-se não exatamente núcleos, mas íons (ou seja, átomos sem alguns elétrons). Assim, esta área chama-se "colisões de íons pesados". Ao se chocarem em velocidades próximas à da luz, esses íons produzem grande número de novas partículas, que são analisadas pelos detetores e pelos softwares para se investigar os princípios físicos (conhecidos ou novos) em ação nesse fenômeno.

Esquema de uma colisão entre dos núcleos atômicos a velocidades próximas da luz

Esquema de uma colisão entre dos núcleos atômicos a velocidades próximas da luz. Inicialmente, eles parecem achatados porque, a essa velocidade, entram em ação fenômenos da relatividade que alteram o espaço e o tempo. No final, grande número de partículas é produzida. Fonte: Dissertação de mestrado de Geraldo Magela Severino Vasconcelos, IFGW/Unicamp (2008), pág. 11. Figura adaptada da tese de PhD de R. Sahoo, Utkal University (2007).Veja também a animação no site do grupo Alice.

Basicamente, dois experimentos estão em andamento sobre isso. Num deles, os membros do Grupo de Léptons se juntam a um grupo maior chamado Star, que envolve 575 colaboradores de 54 instituições de 12 países. Nesse caso, as colisões são feitas no acelerador de partículas RHIC (Colisor Relativístico de Íons Pesados, na sigla em inglês), em Brookhaven, perto de Nova Iorque.

O outro experimento é feito por outro grupo maior, chamado Alice (na sigla em inglês, “Experimento com Um Grande Colisor de Íons” – A Large Íon Colisor Experiment), que envolve 111 instituições de 31 países, totalizando mais de mil colaboradores. O acelerador usado é o LHC (Grande Colisor de Hádrons), no Centro Europeu de Pesquisas Nucleares (CERN), em Genebra, na Suíça.

Também é feita uma colaboração com o laboratório do Fermilab, em Batavia, perto de Chicago, EUA, sobre colisões com alvos fixos (ou seja, aqui, as partículas são atiradas contra um material fixo, enquanto nas outras descritas acima, são atiradas umas contra as outras).

Mais aceleradores: os neutrinos

O Grupo de Léptons colabora com o projeto Minos (em inglês, Busca por Oscilações nos Neutrinos [produzidos no] Injetor Principal), que envolve mais de 200 cientistas de 32 instituições e 6 países. Neste, são estudados neutrinos, partículas que se comportam de modo semelhante ao elétron, mas muito mais leves.

Tamanho não é documento - Os neutrinos são estratégicos na física porque contém informações sobre muitos fenômenos nos quais são produzidos, desde supernovas até a física das partículas, passando pelo próprio Sol. Há aspectos pouco conhecidos seus que podem ter importância dramática. Um é a sua massa, que ainda permanece desconhecida, apesar de se saber que deve ser milhares de vezes menor que a de um elétron. O caso é que os neutrinos são tão numerosos que, mesmo tão leves, se sua massa for maior que certo valor, o campo gravitacional da totalidade deles no Universo pode ter efeitos sensíveis na evolução do Cosmo como um todo – talvez mesmo reverter no futuro remoto o afastamento das galáxias entre si (a expansão do Universo) e conduzir a um colapso cósmico total, o “Big Crunch”.

Um fenômeno novo - Um efeito muito importante envolvendo neutrinos, estudado pela colaboração com o Minos, é um fenômeno confirmado apenas em 2001, após um impasse de mais de 30 anos, chamado “oscilação” dos neutrinos (veja box à direita). É a transformação espontânea dos três tipos conhecidos de neutrinos uns nos outros.

As pesquisas prosseguem para quantificar melhor com que rapidez ela acontece; para determinar a massa dos neutrinos (há uma relação estreita entre a frequência de oscilação e a massa dos três tipos de neutrinos); e para medir outros parâmetros que faltam para completar a descrição teórica do fenômeno.

Os neutrinos do Minos são produzidos acelerando-se prótons com um acelerador chamado “Injetor Principal” e fazendo-os colidirem com grafite. Na colisão, são produzidas novas partículas que, em uma fração de segundo, transformam-se em outras, incluindo neutrinos.

Para se poder estudar a oscilação dos neutrinos, o detetor foi colocado a 700 km do local da produção das partículas, pois elas viajam quase na velocidade da luz e é preciso tempo para que elas oscilem.

Conheça o neutrino, esse personagem singular

Os neutrinos são as partículas elementares mais leves que se conhece, depois do fóton (que tem massa de repouso zero). Ainda não se sabe com precisão a sua massa, mas é provavelmente milhares de vezes mais leve que a do elétron.

Há três tipos de neutrinos, chamados: neutrinos do elétron, do múon e do tau. Têm esses nomes porque possuem propriedades semelhantes a essas três partículas: elétron, múon e tau (o tau, assim como o múon, também se comporta de forma semelhante ao elétron e sobrevive apenas uma fração de segundo depois que é produzido). Esses três tipos são capazes de se transformar espontaneamente uns nos outros – um fenômeno foi descoberto apenas em 2001 e é chamado “oscilação dos neutrinos”, pois ele naturalmente acontece e é revertido em seguida sem parar.

Os neutrinos interagem muito - muito! - fracamente com a matéria. De cada cem mil neutrinos produzidos pelo Sol que atingem a Terra, apenas um é detido por ela; o resto a atravessa inteira e sai pelo outro lado! Portanto, é muito difícil detectá-los. Mas não impossível, uma vez que são também extremamente abundantes: se falarmos só dos neutrinos produzidos pelo Sol, a cada segundo 65 bilhões deles atravessam cada centímetro quadrado da superfície da Terra!

Por serem tão “intangíveis”, os neutrinos fornecem informações importantes sobre fenômenos inacessíveis, como a geração de energia no núcleo do Sol. Eles são produzidos junto com a energia e simplesmente atravessam o astro como se ele fosse transparente, trazendo até nós – para quem souber interpretar – informações sobre como as coisas acontecem lá dentro

O problema dos neutrinos solares

As reações nucleares que produzem a energia do Sol e das estrelas produzem grande quantidade de neutrinos que são lançados para o espaço. Até recentemente, havia uma discrepância grande entre dados experimentais e teóricos sobre os neutrinos produzidos pelo Sol. Os neutrinos detectados na Terra vindos de lá indicavam que o astro produzia apenas de 60% a 70% do que as teorias sobre a produção de energia solar previam. O que estaria errado: nosso conhecmiento sobre o Sol ou sobre os neutrinos? O paradoxo foi resolvido em 2001, no Observatório de Neutrinos de Sudbury (SNO), no Canadá, quando se confirmou que os três tipos de neutrinos (ditos “do elétron”, “do múon” e “do tau”) são capazes de transformar uns nos outros (fenômeno chamado "oscilação dos neutrinos"). Assim, o Sol produz “neutrinos do elétron” e estes transformam-se nos outros dois no caminho para a Terra. Por isso, aqui detectam-se menos neutrinos do elétron do que o que a teoria prevê. Ou seja, as teorias sobre o Sol estavam corretas.

Olhe para os neutrinos onde só eles podem chegar - A fraquíssima interação dos neutrinos com a matéria (vide Box acima) produz, paradoxalmente, uma vantagem: como 99,999% deles atravessam a Terra incólumes, é interessante fazer experimentos subterrâneos, pois aí as outras partículas vindas do espaço serão detidas pela crosta terrestre e não interferirão com os detetores. No caso do Minos, os neutrinos são atirados em direção ao chão, mas rasantes (a 3,3 graus), atravessam uma parte da Terra e, 730 km depois, atingem um detetor situado no fundo do túnel de uma mina desativada em Soudan, no estado de Wisconsin, a uma profundidade equivalente a 30 andares abaixo da superfície (veja a figura abaixo). São detectados em média 4 neutrinos por dia – o resto dos bilhões produzidos diariamente pelo Fermilab atravessa os detectores sem serem notados.

No caso do Minos, os neutrinos são atirados em direção ao chão, mas rasantes (a 3,3 graus), atravessam uma parte da Terra e, 730 km depois, atingem um detetor situado no fundo do túnel de uma mina desativada em Soudan, no estado de Wisconsin, a uma profundidade equivalente a 30 andares abaixo da superfície

As pesquisas com reatores: o Neutrinos-Angra

Neutrinos cariocas - Um experimento com reator nuclear está sendo montado junto da usina nuclear de Angra dos Reis, no estado do Rio de Janeiro (o Projeto Neutrinos-Angra). A idéia é montar um aparelho capaz de detectar a atividade a usina independentemente das informações divulgadas. Isso é possível porque o reator nuclear, enquanto funciona, produz grande quantidade de uma partícula levíssima chamada neutrino, que é capaz atravessar as paredes do prédio da usina praticamente como se não existissem. Ao serem analisados, eles fornecem informações sobre o que acontece no reator.

Com isso, é possível ter informações sobre a potência gerada. Isso tem dois objetivos. Um é a segurança e a eficiência da própria usina. O outro é verificar as informações sobre a quantidade retirada e armazenada de plutônio - que normalmente são enviadas pelo governo brasileiro à Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), órgão da ONU que promove o uso pacífico da energia nuclear, desestimula seu uso militar e fiscaliza os programas nucleares dos países.

O projeto, com o apoio da AIEA, é liderado pela Unicamp e pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) e possui convênio com a Eletronuclear; participam também pesquisadores de mais cinco instituições brasileiras, além de outras da Itália, França e Estados Unidos. Esta é uma das primeiras aplicações tecnológicas da física de neutrinos para salvaguardas e não-proliferação nuclear.

Esquema do detector do Neutrinos-Angra

Esquema do detector do Neutrinos-Angra. A = o "alvo", constituído de uma tonelada de líquido com pequena porção de germânio (o alvo serve para que os neutrinos interajam com ele e formem novas partículas, como pósitrons e nêutrons, que serão detectadas pelas outras partes); B = detector de raios gama (produzidos pela interação dos pósitrons com os elétrons do material); C = blindagem contra radiação vinda de fora; D = sistema de veto, para eliminar sinais vindos de raios cósmicos que consigam atravessar a blinagem.
Fonte: projeto básico do detector (em PDF) apresentado por Anjos et al.

As pesquisas com raios cósmicos ultraenergéticos: o Projeto Pierre Auger

Mistério! - Uma linha de pesquisas importante relacionada com os raios cósmicos é o Projeto Pierre Auger, que envolve mais de 250 pesquisadores de 17 países. O problema que esse projeto quer resolver é o da existência de raios cósmicos tão energéticos que apenas uma de suas partículas pode ter energia cinética equivalente à de uma bola de tênis voando a 100 km/h. Tudo isso concentrado em uma única partícula subatômica! São os muito propriamente chamados raios cósmicos ultraenergéticos.

Sua origem – que fenômeno cósmico poderia produzi-los – permanece um mistério. A dificuldade é que são extremamente raros: das partículas mais energéticas, apenas uma por século a cada quilômetro quadrado atinge a Terra. Por isso, não se tem ainda dados suficientes para se encontrar uma explicação – que pode ser algo trivial, mas pode também levar a novas descobertas na astronomia e na física.

Para resolver esse problema, a idéia foi construir um conjunto de detectores tão grande que fosse capaz de identificar essas partículas em número suficiente para se poder chegar a alguma conclusão, mesmo sendo elas tão raras. O projeto Pierre Auger, então, está montando dois grandes observatórios, um perto da cidade de Malargüe, na província de Mendoza, na Argentina, perto dos Andes, e outro no sudeste do estado do Colorado, nos Estados Unidos. O na Argentina está em estágio mais adiantado. Ali, 1600 detectores estão espalhados por 3 mil quilômetros quadrados; a maior parte deles consiste basicamente tanques de água de 11 mil litros cada.

Área ocupada pelos Dectores do Observatório Pierre Auger Sul, na Argentina

Área ocupada pelos detetores do observatório Pierre Auger Sul, na Argentina.
Fonte: Google Earth.

O começo da solução - Com o acúmulo dos dados, já foi possível, em 2007, concluir-se que esses raios ultraenergéticos vêm da direção de núcleos de galáxias de um tipo especial que emitem imensa quantidade de energia (são os chamados “núcleos ativos de galáxias”). Imagina-se que toda essa energia seja devida à queda de grandes quantidades de matéria em um buraco negro supermassivo (com massa equivalente à de bilhões de estrelas) situado no centro dessas galáxias. Os núcleos ativos de galáxias são as mais intensas fontes de luz permanentes conhecidas do Universo.

Porém, os raios cósmicos ultraenergéticos não necessariamente são produzidos por eles – por exemplo, podem ser resultado da interação entre alguma coisa que esses núcleos emitem e algo no meio do caminho para cá. Mas identificar essa correlação já é um avanço.

Os neutrinos cósmicos

Supernova! Neutrino! - Uma das maneiras de se estudar eventos cósmicos muito violentos, como as supernovas (grandes colapsos de estrelas que liberam energia equivalente à de uma galáxia inteira) é analisar os neutrinos que elas produzem em grande quantidade (veja o Box “Conheça o neutrino, esse personagem singular” logo abaixo do subitem “Mais aceleradores: os neutrinos”, acima). As supernovas são responsáveis, por exemplo, pela síntese dos elementos químicos mais pesados que o ferro (como prata, ouro, chumbo e mesmo alguns muito pesados que não existem na Terra, chamados transurânicos).

O Grupo de Léptons faz pesquisas com neutrinos de supernovas em colaboração com o LVD (Large Volume Detector), que envolve 14 instituições de 5 países e cujo detetor está situado no meio de um túnel rodoviário de 10,6 km de comprimento que passa debaixo do pico Gran Sasso, o culminante dos Apeninos, na Itália (perto da cidade do mesmo nome). Há 1300 metros de rocha sobre esses detectores, para que eles não sejam enganados por outros raios cósmicos – estes são bloqueados pela crosta terrestre, mas os neutrinos, para os quais a rocha é praticamente transparente, alcançam sem dificuldade os equipamentos.

História do Grupo

O grupo foi fundado na década de 1980 por iniciativa de Armando Turtelli, então no Grupo de Emulsões. No começo, Turtelli deu continuidade às pesquisas que fazia antes, sobre raios cósmicos e sobre neutrinos.

No início, era o lépton - A idéia inicial era montar um laboratório subterrâneo para observar neutrinos e múons penetrantes (os múons são partículas que se comportam de forma semelhante ao elétron, mas, ao contrário deste, sobrevivem apenas uma fração de segundo, transformando-se em seguida em outras partículas). Seria montado no subsolo para se evitar a influência de outros componentes da radiação cósmica, aproveitando que neutrinos e múons conseguem atravessar a rocha. Como neutrinos e múons pertencem à classe dos léptons (conjunto de partículas com certas semelhanças ao elétron), o grupo foi chamado “Grupo de Léptons” - nome que permanece até hoje por tradição, apesar de os interesses terem se diversificado. Um dos lugares sondados foi a mina de Morro Velho, no município de Nova Lima, perto de Belo Horizonte, em Minas Gerais, na qual medidas de raios cósmicos já haviam sido feitas décadas antes. Porém, decidiu-se pelas colaborações internacionais com detectores em outros lugares.

Na história do grupo, além dos projetos mencionados no corpo deste texto, houve a interação com o LVD para o estudo de chuveiros atmosféricos. Chama-se “chuveiros atmosféricos” à produção de grande número de partículas pela interação entre raios cósmicos bastante energéticos e as moléculas do topo da atmosfera terrestre. O seu estudo é uma tradição das pesquisas em raios cósmicos no Brasil.

O estudo do LVD evoluiu para a participação em um projeto bem mais amplo para o estudo dos raios cósmicos ultraenergéticos, o projeto Pierre Auger. Grande parte dos envolvidos nessa parte da pesquisa do LVD migrou para lá. Em 1996, Carlos Ourivio Escobar chegou à Unicamp, vindo da USP, e deu grande impulso para a inclusão do Grupo de Léptons nesse projeto.

Houve também experimentos para análise de raios cósmicos por meio de balões – um outro meio de observação, no qual os detetores são erguidos até grandes altitudes para evitar que a atmosfera da Terra atrapalhe. O experimento foi feito em colaboração com o Instituto de Pesquisas Nucleares (INR) da Rússia e também com o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).

No continente gelado - O grupo interagiu também com o telescópio de múons Gantar, que funcionou entre dezembro de 1986 a 1992 na Estação Antártica Comandante Ferraz, na base brasileira na Ilha do Rei George, na costa da Antártida. Foi talvez o primeiro detector não-fixo de radiação cósmica operando em tempo contínuo em latitudes antárticas (no fim dos anos 1980, apareceu outro na base dos Estados Unidos no Pólo Sul, o Amanda, para detecção de múons e neutrinos). As altas latitudes são bastante propícias para a deteção de raios cósmicos, pois as partículas eletricamente carregadas dos raios cósmicos são parcialmente “guiadas” pelo campo magnético da Terra e acabam “desembocando” perto dos pólos (veja figura ao lado).

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Saiba mais

Partículas elementares - Do Projeto Desafios da Física do CBPF (em PDF, 4MB)
http://mesonpi.cat.cbpf.br/desafios/pdf/Folder_Particulas_elementares.pdf

O que são raios cósmicos? (Armando Turtelli) - ComCiência (maio de 2003). No menu à esquerda, há várias matérias sobre raios cósmicos, inclusive uma sobre o Projeto Pierre Auger, de Carlos Ourivio Escobar
http://www.comciencia.br/reportagens/cosmicos/cos08.shtml.

Raios cósmicos: energias extremas do Universo - Do Projeto Desafios da Física do CBPF (em PDF).
http://mesonpi.cat.cbpf.br/desafios/pdf/Folder_Raios_Cosmicos.pdf

Neutrinos - Do Projeto Desafios da Física do CBPF (em PDF).
http://mesonpi.cat.cbpf.br/desafios/pdf/FolderNeutrinos_BaixaRes.pdf

Detectando neutrinos (Luiz Sugimoto) - Jornal da Unicamp 421 (9 a 15 de março de 2009) - Sobre o projeto Neutrinos-Angra.
http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/marco2009/ju421_pag09.php

A longa jornada dos raios cósmicos (Carlos Fioravanti) - Pesquisa Fapesp 142 (dezembro de 2007) - Sobre as conclusões do Projeto Pierre Auger sobre a direção de onde vêm os raios cósmicos ultraenergéticos.
http://revistapesquisa.fapesp.br/?art=3408&bd=1&pg=1&lg=